78 anos na preservação, divulgação e fiscalização dos bens culturais baianos
No estado da Bahia há 174 bens de natureza material tombados individualmente e mais de 9 mil imóveis tombados em conjunto
A Bahia, ocupando uma área de 567.692,669 km², é o quinto maior estado do país e possui um dos maiores e mais significativos acervos de bens culturais do Brasil. A organização da salvaguarda deste acervo cultural, primazia do Estado iniciada já nas primeiras décadas do século XX, foram intensificadas após a criação do SPHAN, a quem coube as tarefas de identificação, restauração e preservação dos bens culturais de excepcional valor. Em 1937, foi criado o 2º Distrito do SPHAN, com sede em Salvador, abrangendo os estados da Bahia e Sergipe. Em 1990, transformou-se em 7ª Coordenação Regional, atual Superintendência Regional do IPHAN, com jurisdição sobre a Bahia. Em 1988 a sede passou do Museu dos Sete Candeeiros para a Casa Berquó, imóvel do século XVII, tombado individualmente, situado no centro histórico de Salvador.
A ação desenvolvida ao longo dos 78 anos de existência da instituição no estado da Bahia, resulta hoje na proteção legal de 174 bens de natureza material tombados individualmente e mais de 9 mil imóveis tombados em conjunto. São considerados como bens individuais: o Conjunto Arquitetônico e Paisagístico de Cachoeira; o Conjunto Paisagístico de Iguatu, em Andaraí; o Conjunto Arquitetônico, Urbanístico e Paisagístico de Itaparica; o Conjunto Arquitetônico e Paisagístico de Lençóis; o Conjunto Arquitetônico, Urbanístico e Paisagístico de Monte Santo; o Conjunto Arquitetônico e Paisagístico de Mucugê; o Conjunto Arquitetônico e Paisagístico da Cidade Alta de Porto Seguro; o Município de Porto Seguro; o Conjunto Arquitetônico de Rio de Contas; o Centro Histórico de Salvador; o Conjunto Arquitetônico, Urbanístico e Paisagístico de Salvador – trechos da Av. Otávio Mangabeira, Conceição da Praia, Dique do Tororó, Conjuntos Urbanísticos e Vales Florestais, largo dos Mares, Penha, Praça Ana Nery, Praça Severino Vieira, Outeiro de Santo Antônio da Barra, Praça da Sé e Passo; Conjunto Arquitetônico da Rua Carneiro de Campos e Travessa Aquino Sodré; e, finalmente, Conjunto Paisagístico de Santa Cruz Cabrália.
Há também os objetos de registro do patrimônio imaterial: o Samba de Roda do Recôncavo, o Ofício das Baianas de Acarajé, a Roda de Capoeira, Ofício dos Mestres de Capoeira e a Festa do Senhor do Bonfim A relevância deste patrimônio é reconhecida pela UNESCO ao distinguir o Centro Histórico da Cidade do Salvador e a Costa do Descobrimento como Patrimônio Mundial, além da inscrição do Samba de Roda do Recôncavo na lista das Obras Primas do Patrimônio Oral e Imaterial da Humanidade. O Conjunto da Igreja e o Claustro da Ordem Primeira de São Francisco de Salvador foi eleito uma das 07 maravilhas do Mundo Lusófono.
Patrimônio Arqueológico
A Bahia possui um dos maiores e mais importantes patrimônios arqueológicos do Brasil. Ainda muito pouco estudados, e muitos nem sequer referenciados, a sua preservação é fundamental, uma vez que sua natureza é finita, frágil e não renovável.
Foto: Prof. Carlos Etchevarne
Os locais de pinturas e
gravuras rupestres podem ser considerados verdadeiros documentos sobre a
presença e atuação dos grupos pré-coloniais em determinada região, ao passo que
constituem marcos de memória social para as populações contemporâneas. Assim sendo,
os sítios de arte rupestre assumem a condição de monumentos históricos que
evocam configurações sociais diferentes daquelas de origem europeia, mas
indiscutivelmente associadas ao processo de ocupação humana do território
baiano.
No âmbito da arqueologia
pré-histórica, tem-se a região da Chapada Diamantina como aquela que, hoje,
apresenta uma maior concentração dos sítios identificados e estudados.
Investigações mais recentes, contudo, revelam o enorme potencial do Complexo
Arqueológico de Paulo Afonso e da Região Arqueológica de Central, além da Costa
do Descobrimento, ainda não devidamente exploradas.
Além dos sítios
arqueológicos pré-coloniais, muitos outros do período colonial brasileiro estão
distribuídos por todo o Estado. No Centro Histórico da Cidade do Salvador, uma
área que abrange um total de onze quarteirões e engloba obras de dois programas
de habitação popular, foram resgatados cerca de 800.000 fragmentos e peças
arqueológicas. Essa coleção, extremamente exuberante, mostra uma mistura de culturas
impressionante, de vestígios culturais dos mais diversos continentes, como
Ásia, Europa, África e Américas, incluindo a produção local. Estes revelam
traços étnicos únicos reproduzidos nas decorações estilísticas, representadas
em muitas de suas peças.
A partir do ano 2002, com
a criação da Portaria IPHAN nº 230, que estabelece os dispositivos para a
compatibilização e obtenção de licenças ambientais em áreas de preservação
arqueológica, a demanda de processos de licenciamento ambiental em arqueologia
tem aumentado significativamente a cada ano. A Bahia é o quinto
estado da federação com maior número de portarias publicadas,
ficando atrás apenas de São Paulo, Santa Catarina, Minas Gerais e Mato Grosso.
Sítios
Urbanos Protegidos e do Patrimônio Arquitetônico
Dos sítios urbanos
protegidos na Bahia, o acervo arquitetônico e paisagístico da Cidade do
Salvador, primeira capital do Brasil, merece destaque, pois, além do seu
excepcional valor cultural, riquíssimo em história e arquitetura, destaca-se
por sua extensão. O conjunto edificado do seu Centro Histórico, tombado pelo
IPHAN e reconhecido pela UNESCO como “Patrimônio Mundial”, possui cerca de
3.000 imóveis. Além disso, a cidade possui sete áreas cujos acervos
arquitetônicos e paisagísticos são protegidos em nível federal, a saber: Dique
do Tororó; Praça Ana Néri – Largo da Palma; Outeiro de Santo Antônio da Barra; Praça
Severino Vieira – Largo da Saúde; Perímetro do Subdistrito da Penha – Área da
Igreja do Senhor do Bonfim e seu entorno; Perímetro dos Subdistritos dos Mares
e da Penha – Área de entorno das Igrejas de Nossa Senhora da Boa Viagem, Igreja
de Nossa Senhora da Penha e Igreja e Mosteiro de Nossa Senhora de Monte Serrat.;
Trechos da Avenida Otávio Mangabeira (Orla Atlântica), das praias do Chega Nego
até Piatã.
Salvador concentra mais da metade dos bens tombados individualmente no estado, totalizando 90 monumentos, entre os quais alguns dos elementos mais significativos da arte religiosa e civil do país, a exemplo da Igreja e Convento de São Francisco, referência mundial no estudo da talha e da azulejaria, e a Casa dos Sete Candeeiros.
Salvador concentra mais da metade dos bens tombados individualmente no estado, totalizando 90 monumentos, entre os quais alguns dos elementos mais significativos da arte religiosa e civil do país, a exemplo da Igreja e Convento de São Francisco, referência mundial no estudo da talha e da azulejaria, e a Casa dos Sete Candeeiros.
Os demais núcleos tombados
pelo IPHAN no estado retratam o processo de ocupação do território baiano até
final do século XIX, inicialmente de caráter
agrícola e ruralista
com a ocupação costeira fomentada pela cultura extrativista da cana-de-açúcar e,
posteriormente, do fumo. Representam esse momento as cidades tombadas de Cachoeira,
Itaparica, Porto Seguro e Santa Cruz Cabrália. A interiorização do território,
ainda que tenha se manifestado timidamente desde a chegada
do elemento colonizador, somente se
intensifica no final do século XVII, com a descoberta do ouro ,
quando são definitivamente ultrapassados os obstáculos naturais
entre o litoral e o planalto diamantino,
proporcionando o primeiro grande surto de ocupação do interior do Estado.
Notadamente com o estabelecimento de uma cultura verdadeiramente urbana. Rio de
Contas, surgida no século XVIII guarda ainda
hoje a estrutura
morfológica da época da mineração aurífera. Também Mucugê,
Igatú (no município de Andaraí) e Lençóis representam a importância do ciclo
minerador de diamantes para a colonização do interior baiano. Monte Santo, por
outro lado, guarda o registro da ocupação dos Sertões e da importância da religiosidade
na estruturação desse território.
A
área sob jurisdição do IPHAN no Sítio do Descobrimento do Brasil compreende
expressiva faixa litorânea dos municípios de Porto Seguro e Santa Cruz
Cabrália, com extensão aproximada de 60 km de comprimento por 3 km de largura, somados aos 30 km que levam ao Monte
Pascoal. Este trecho abriga áreas de preservação ambiental, zonas turísticas,
territórios indígenas, sítios arqueológicos, históricos e paisagísticos
representativos da biodiversidade nacional e de relevante importância para a
história do Estado e do País como um todo.
Algumas dessas áreas já foram reconhecidas pela UNESCO como Patrimônio Natural da
humanidade, como é o caso do Parque Nacional do Monte Pascoal, do Parque
Pau-Brasil, da Estação Ecológica Pau-Brasil. Dentro da extensa área legalmente
protegida destacam-se vários conjuntos arquitetônicos e paisagísticos, como a
Cidade Histórica de Porto Seguro, o Arraial D’Ajuda, Vale Verde (Antigo
Aldeamento Indígena), Trancoso, Caraíva e Orla Marítima. Além disso, o Escritório Técnico do IPHAN em Porto Seguro
atende às demandas oriundas de outros 54 municípios do sul da Bahia.
Vista das
falézias, Porto Seguro, Acervo: IPHAN
Vista da
Cidade Alta, Porto Seguro, Acervo: IPHAN
O Escritório Técnico de Cachoeira atende à demanda proveniente de 104
municípios, do Recôncavo e centro norte do estado. Com destaque para a cidade
de Cachoeira, localizada às margens do Rio Paraguaçu, no Recôncavo Baiano, que possui
um expressivo acervo arquitetônico do período colonial, e, só no seu conjunto
urbano, possui 32 bens protegidos, o que representa 30% de todos aqueles
tombados pelo IPHAN na Bahia, número superior ao acervo protegido de vários
estados da federação. Na órbita de sua atuação direta estão os processos de
inscrição na Lista do Patrimônio da Humanidade.
Vista das cidades de São Félix e Cachoeira.
Fonte; PCL, 2005
O Escritório Técnico de Lençóis é
responsável pela gestão e preservação de cerca de 25% dos conjuntos tombados no
estado, atuando no Conjunto Arquitetônico e Paisagístico do município de
Lençóis, no Conjunto Paisagístico do Morro do Pai Inácio e Rio Mucugezinho,
município de Palmeiras, e no Conjunto Arquitetônico, Urbanístico e Paisagístico
de Igatu, município de Andaraí. Além disso, atende à demanda de mais 48
municípios entre a Chapada Diamantina e o extremo oeste do Estado, a exemplo de
Barra, Barreiras, Brotas de Macaúbas, Seabra e Xique-Xique, entre outros. Vale
salientar que se trata de uma das regiões com maior acervo arqueológico
histórico e pré-histórico do estado.
Vista do Conj. da cidade de Lençóis, Etec
Lençóis
O Escritório Técnico de Rio de Contas responde pelo Conjunto Arquitetônico e Urbanístico de Mucugê e pelo Conjunto Arquitetônico de Rio de Contas, além de 05 bens tombados individualmente neste último município. Além disso, atende às solicitações de outros 50 municípios.
O Escritório Técnico do Baixo Sul passará a responder por 94 municípios, com destaque para Jaguaripe, Valença, Camamu e Cairú, onde está localizada a Fortaleza do Morro de São Paulo.
Patrimônio Imaterial e da Educação Patrimonial
A partir do ano de 2000, com o Decreto Lei nº 3551, de 04 de agosto, que institui o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial, da criação do Programa Nacional do Patrimônio Imaterial – PNPI e da consolidação do Inventário Nacional de Referências Culturais, houve um significativo aumento da demanda de proteção para os bens de natureza imaterial.
O Núcleo de Patrimônio Imaterial da Superintendência da Bahia desenvolve uma série de projetos, especificamente ligados à Educação Patrimonial, ao Mapeamento dos Terreiros Matriciais de Candomblé, aos Inventários de Referências Culturais e as Ações de Salvaguarda do Samba de Roda do Recôncavo Baiano e do Ofício das Baianas de Acarajé.
O Projeto de Salvaguarda do Samba de Roda do Recôncavo Baiano envolve 26 municípios do Estado e vem fomentando a realização de oficinas de transmissão de saberes e Encontros dos Sambadores na Bahia.
O Projeto de Salvaguarda do Ofício das Baianas de Acarajé está sendo desenvolvido em parceria com a Associação das Baianas de Acarajé, Mingau, Receptivo e Similares – ABAM, que tem abragência nacional e possui 2.300 associados. Foi reinaugurado o Memorial das Baianas localizado em Salvador, totalmente reestruturado, para promover as oficinas de transmissão de saberes (fio de contas, roupa de baiana, bordado a mão, rechillieu), e a implantação de um Centro de Documentação no Pelourinho, em Salvador.
Do total de 16 bens Registrados como Patrimônio Imaterial do Brasil quatro deles encontram suas origens na Bahia: a Festa do Senhor do Bonfim, o Samba de Roda do Recôncavo Baiano, o Ofício das Baianas de Acarajé, a Roda de Capoeira e o Ofício dos Mestres de Capoeira, estes últimos, ainda aguardando a conclusão do seu plano de salvaguarda.
As ações do IPHAN voltadas para os Terreiros de Candomblé remotam aos anos 80 quando foi iniciado, nesta Regional, o projeto de Mapeamento de Sítios e Monumentos Religiosos Negros da Bania – MAMNBA, que juntamente com a Prefeitura de Salvador o projeto pioneiro de identificar e instruir os processos de tombamento dos sítios religiosos considerados matrizes do culto afro-brasileiro no país.
O Mapeamento dos Terreiros de Salvador realizado em 2008, sob a coordenação técnica do Centro de Estudos Afro-Orientais – CEAO, cadastrou 1.164 terreiros de Candomblé na cidade. Esses estudos apontam as causas históricas da grande concentração de terreiros em Salvador e nos seus municípios vizinhos. Uma série de ações públicas a nível municipal, estadual e federal tem sido direcionadas para os cultos afro-brasileiros.
Bens Móveis e Integrados
O Setor de Bens Móveis e Integrados do IPHAN na Bahia remonta à criação da própria Instituição, sendo até hoje uma referência na restauração de bens culturais. A concentração do setor na Cidade dos Salvador exige do corpo técnico constantes deslocamentos, a fim de realizar as ações de fiscalização e orientação das intervenções nas obras protegidas. O Setor mantem um Atelier de Conservação e Restauração, que realiza intervenções emergenciais nos acervos das edificações tombadas em nível federal, além daquelas propostas em planos de ação.
Com grande êxito, o setor dá continuidade ao Inventário Nacional de Bens Móveis e Integrados (INBMI), além de promover a organização e estruturação do arquivo fotográfico e textual, referente ao material produzido nas pesquisas de campo para as brochuras do INBMI, assim como o Inventário do Patrimônio Azulejar de Fachadas, nos monumentos da Cidade do Salvador. Atendendo a Instrução Normativa nº 01, de 11/06/2007, que regulamenta o Cadastro dos Negociantes de Obras de Arte, realiza ainda a conferência e correção dos dados e da documentação encaminhada à Superintendência do IPHAN na Bahia.
Ações de gestão e preservação
Para executar as ações de gestão e preservação dos bens culturais, sob sua responsabilidade, a Superintendência do IPHAN na Bahia conta com a sede na cidade de Salvador e mais quatro escritórios técnicos nas cidades de Porto Seguro, Cachoeira, Lençóis e Rio de Contas e, em fase de implantação, o escritório técnico do Baixo Sul. A sede do IPHAN além das solicitações da Capital Baiana, atende a mais 67 municípios, além de ser responsável pelo apoio técnico às ações empreendidas em todo o estado.
Do ponto de vista técnico, cada Escritório Técnico conta com um arquiteto que responde pelas ações de fiscalização, preservação e fomento dos bens culturais. É extensa a territorialidade das áreas protegidas e a complexidade dos condicionantes envolvidos em sua preservação, o que leva a Superintendência do IPHAN a uma busca constante de reestruturar e fortalecer os Escritórios Técnicos e a redefinir suas áreas de abrangência.
O IPHAN possui bens tombados em 26 municípios do estado. Esse número, embora seja de grande significação, representa menos de 10% dos 417 municípios da Bahia. Somado a isso, existem inúmeras solicitações de tombamento, em trâmite na Instituição, provenientes de todo o Estado, que indicam um vasto e rico território a ser explorado, demonstrando uma clara demanda da sociedade em ramificar a atuação do IPHAN por todo o território da Bahia.
Como exemplo disso, pode-se destacar os diversos processos pelos quais passou a transformação do Estado a partir do final do século XIX e durante todo o século XX: a ocupação e expansão do oeste baiano, além São Francisco, o processo de industrialização do Estado depois da década de 1950, a importância das ferrovias no processo de expansão e desenvolvimento, dentre outros. A região do Vale do Rio São Francisco, tão importante para a consolidação da ocupação do território brasileiro, quanto para a formação do imaginário nacional, indica outra lacuna a ser preenchida, assim como o extremo oeste do estado deve ser alvo de uma ação de inventário de identificação do patrimônio cultural por parte do IPHAN.