terça-feira, 21 de julho de 2015

Obra-prima sacra é restaurada


Uma das principais obras sacras do barroco brasileiro, a pintura do forro da Igreja da Ordem Terceira de São Domingos - da segunda metade do século XVIII - está sendo salva por equipe de restauradores contratada pelo Instituto do Patrimônio Histórico Artístico Nacional (Iphan).


A obra foi pintada por José Joaquim da Rocha, fundador da Escola Baiana de Pintura, considerado o introdutor no país da técnica da perspectiva em tetos, na qual o artista pinta um último "patamar" na parte interna da igreja com abertura para o céu. A área do forro da igreja - localizada no largo do Terreiro de Jesus, Centro Histórico - é um painel de 173 m², preenchidos com santos, anjos e elementos típicos do barroco.

É a primeira restauração feita na obra há décadas, revelando trabalhos anteriores que deformaram a pintura original. O restaurador Júlio Maia, que lidera a equipe, disse que ao examinar o forro pela primeira vez em 2014 teve a uma ideia da extensão do problema.

"A estrutura de madeira situada entre o forro e o teto estava comprometida, com infestação de cupins, apodrecimento com ameaça de desabamento, sendo necessária uma consolidação para que a pintura começasse a ser restaurada", disse.

O forro foi desmontado, tábua a tábua e a equipe de Maia passou a trabalhar em ateliê montado num dos salões superiores da igreja. O painel já havia sido restaurado por pintores famosos do século XIX como Bento Capinam, Rufino Sales e José Antônio da Cunha Couto.


Depois, outras foram feitas sem muitas técnicas, que deformaram a obra. Acrescente-se a isso grossa camada de sujeira acumulada, na qual os restauradores identificaram entre outras substâncias, "fezes de mosca".

Tudo foi retirado graças a trabalho meticuloso dos restauradores a golpes suaves de espátulas e limpeza com chumaços de algodão. "Com a retirada da sujeira, descobrimos traços de pintura de estilo amador", disse Maia, apontando para a imagem de um pilar com traço totalmente deformado. "Procuramos restituir o que o autor  pintou," disse.

Folhas de ouro

Um dos achados da restauração foi o uso de folhas de ouro na pintura. Geralmente, os douradores do passado utilizavam essa fina película para adornar talhas e molduras. A mestra em belas artes e doutoranda pela Unicamp Mônica Farias, convidada por Maia para acompanhar a restauração, se encantou com a descoberta.

"As folhas de ouro foram usadas para dar volumetria em partes do painel", explicou. O volume confere noção de profundidade a uma pintura e é um das características do estilo barroco.

Mesmo o forro do teto estando a cerca de 17 metros de altura do piso da nave da igreja, será possível observar os contornos dourados. Mônica disse não conhecer referência em outra parte do país de uso de folhas de ouro em pinturas sacras do período barroco.





PAC Cidades Históricas tem requalificado igrejas famosas

A restauração da Igreja de São Domingos é a primeira obra na Bahia beneficiada pelo PAC Cidades Históricas, através do Iphan.

O investimento total previsto na igreja é de R$ 7,5 milhões para obras de engenharia na estrutura do templo e a restauração das obras artísticas.

O superintendente do Iphan na Bahia, Carlos Amorim, explicou que São Domingos foi uma das primeiras a ser restaurada pela sua relevância histórica dentro da arte sacra brasileira e por sua localização no Centro Histórico de Salvador.

“Um dos critérios do programa é, justamente, mostrar à sociedade a importância da obra no contexto da cidade. As pessoas vão poder visitar a igreja e verificar a qualidade artística do monumento e também valorizá-lo”, disse.

Ele lembra que nunca houve uma restauração completa da Igreja São Domingos como está sendo feita agora, apesar das obras artísticas que ela possui.

Informou que o PAC Cidades Históricas  está promovendo restaurações na catedral Basílica e na Igreja do Passo,  depois de ter executado obra na Igreja dos Clérigos. Segundo Amorim, o Iphan está preparando também o projeto de restauração da Igreja da Conceição da Praia, que abriga outra pintura de forro de teto famosa de José Joaquim da Rocha.

Ele se mostrou entusiasmado com o trabalho de restauração na Igreja de São Domingos. Lembrou que, além da descoberta do uso das folhas de ouro na pintura, os restauradores identificaram os traços do desenho do painel feito por José Joaquim da Rocha antes de cobrir a pintura.

“Há também dois quadros lindos do mesmo artista que serão restaurados e poderiam figurar em qualquer museu do mundo pela sua qualidade técnica”. Amorim estima que as obras da Igreja de São Domingos serão concluídas em dezembro.

O restaurador Julio Maia pretende entregar a restauração do forro de teto em, no máximo, dois meses. Ele está com mais de 80% do trabalho prontos e executa a finalização das últimas tábuas do painel para recolocá-las no local original.

Fonte: Jornal A Tarde - Edição de 19-07, página A6 
             – por Biaggio Talento

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